quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Do medo ou a explicação do vazio

É preciso não achar estranho o que não tem estranheza nenhuma, 
o melhor é a Verdade ! 

Pode ser desta caixa que deixei cair quando fui à pouco ao exterior. 
Devia ter um ar extraviado, mas certo, pois aconteceu-me qualquer coisa,
 já não posso duvidar ou então é o mundo que se inverteu.
 Agora, pergunto a mim própria, porquê? 
Queria ver claramente o que se passa comigo, antes que seja tarde. 
Arrastar-me para onde? 
Para o fundo, em direcção ao Medo!! 

Admiro-me como se pode mentir com a verdade na mão. 
São tudo hipóteses e deixo-me ficar sentada, de braços caídos, 
por vezes esboço algumas palavras, sem coragem bocejo e quando findar a noite sairei deste lugar vazio. 

Mais uns segundos, a voz desliza e desaparece, bastaria tão pouco para fazer parar a música ! 
Dêem-me licença de não partilhar da vossa opinião. 
Existem momentos em que pergunto 
se o Domingo afinal é deles e não meu. 
Três horas. 

Três horas é sempre tarde ou cedo para aquilo que queremos fazer. 

HHoje

terça-feira, 24 de novembro de 2015

O que contém o sono


Às vezes choras.
Às vezes sais para o terraço ao frio que começa.
Não sabes o que contém o sono daquela que está na cama.
Tu, daquele corpo, querias partir, querias voltar a outros corpos,
ao teu corpo, voltar a ti mesmo
e ao mesmo tempo é por teres de fazer isso que choras.

Marguerite Duras

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Vade Mecum

De que me serviu ir correr mundo,
arrastar, de cidade em cidade, 
um amor que pesava mais do que mil malas; 
mostrar a mil homens o teu nome escrito em mil alfabetos 
e uma estampa do teu rosto que eu julgava feliz? 
De que me serviu recusar esses mil homens, 
e os outros mil que fizeram de tudo para parar-me, 
mil vezes me penteando as pregas do vestido cansado de viagens, 
ou dizendo o seu nome tão bonito em mil línguas 
que eu nunca entenderia? 
Porque era apenas atrás de ti que eu corria o mundo, 
era com a tua voz nos meus ouvidos que eu arrastava o fardo
do amor de cidade em cidade, 
o teu nome nos meus lábios de cidade em cidade, 
o teu rosto nos meus olhos durante toda a viagem,
mas tu partias sempre na véspera de eu chegar.


Maria do Rosário Pedreira

Não mais te devolvo

Vou buscar-te ao fim da tarde,
porque a noite só escurece 
contigo ao meu lado, 
porque a noite aprende por ti
o caminho aberto das estrelas
Não mais te devolvo
vou buscar-te ao fim da tarde,
e verás como preparei a casa, 
como escolhi a música, como, enfim, espalhei
os objectos mais impressionados contigo,
os que ganharam vida por se interporem
na espessura estreita que vai do meu
ao teu coração
e não mais te devolvo, correndo todos os
riscos de não amanhecer nunca
numa loucura propositada por ti
Não mais te devolvo,
ocuparás o mundo debaixo e sobre mim,
e não haverá mais mundo sem que seja assim
valter hugo mãe

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Semblante coragem

Esperava coragem,
Esperava voragem.

Nem coragem, nem voragem.
Quanto pesa a coragem?

A realidade embateu na expectativa
e esfumou-se em palavras !

Da melhor e assertiva forma foi revelada,
Sem olhares, sem contacto.
Do tempo perdido fica o melhor do pior,
do sentir que este dia nada colheu.

Parti hoje para nunca te responder.
Apenas ser uma palavra.


HHoje 2015

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Não cuspas cá para baixo

Do 
"assento etéreo" 
Vais olhar 
(não cuspas cá para baixo, por favor ! ) 
e saber 
que, 
matematicamente, 
ou melhor dizendo, 
poeticamente 
haverão milhares de combinações 
para as palavras, 
para as nossas palavras, 
para cinco palavras apenas ! 
para sete palavras apenas ! 
para um milhão de palavras apenas !

Mas nós sabemos 
que só tu 
consegues 
construir a "coisa lírica", 
o modo de sentir.

Aí, 
vais espalhar a tua arte 
por muitos mundos, pelos mundos 
onde passares.

Por isso, 
não nos preocupamos 
porque o que aí é dito, 
vai ser ouvido por nós, 
assim que aí chegarmos.

Muitos abraços, 
....daqui. 
(não cuspas cá para baixo).


MAN

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Ignorantes pânicos

Alguns ainda se iludem com adocicar o corpo, 
fazem-no em pânico ignorantes do
fermento que é para a alma,
ficam gordos
preparados para serem despojados
das carnes que inutilizaram,
e já os junto à terra como se evadidos para o pó,
criarem esperanças parvas nos outros


Valter Hugo Mãe

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Se me legasses as tuas mãos

Poderias mergulhar como um só bloco no nada para onde vão os mortos:
consolar-me-ia se me legasses as tuas mãos.
Apenas as tuas mãos subsistiriam, separadas de ti, inexplicáveis como as dos deuses de mármore que se tornam pó e cal dos seus próprios túmulos.
Elas sobreviveriam aos teus actos, aos miseráveis corpos que acariciaram.
Entre as coisas e ti, elas já não seriam intermediários: seriam elas próprias,
transformadas em coisas.
Voltando a ser inocentes, pois tu já lá não estarias para fazer delas tuas cúmplices, tristes como galgos sem dono, desconcertadas como arcanjos a quem já nenhum deus dá ordens, as tuas mãos vãs repousariam sobre os joelhos das trevas.
As tuas mãos abertas, incapazes de dar ou de agarrar qualquer alegria,
ter-me-iam deixado cair como uma boneca quebrada.
Beijo ao nível do pulso essas mãos indiferentes que a tua vontade já não afasta das minhas;
acaricio a artéria azul, a coluna de sangue que outrora, incessante como o jacto de uma fonte,
surgia do solo do teu coração.
Com pequenos soluços satisfeitos, encosto a cabeça como uma criança,
entre as palmas cheias de estrelas, de cruzes,
de precipícios daquilo que foi o meu destino.
MY