À força de me mudar
aprendi a não encostar
os móveis às paredes,
a não pregar muito fundo,
a aparafusar apenas o necessário.
Aprendi a respeitar os rastos
dos antigos inquilinos:
um prego, uma moldura,
uma pequena poleia,
que ficou no seu lugar
embora me estorvem.
Há manchas que herdo
sem as limpar,
entro na nova casa
procurando entender,
mais do que isso,
vendo por onde haverei de me ir embora.
Deixo que a mudança
se dissolva como uma febre,
como uma crosta que cai,
não quero fazer barulho.
Porque os antigos inquilinos
nunca morrem.
Quando vamos embora,
quando deixamos outra vez
as paredes como as encontrámos,
fica sempre um prego deles
nalgum canto
ou um estrago
que não soubemos resolver.
FMorábito
O pior não são as marcas que deixamos nas paredes, no chão, no tecto. O pior são as marcas que as mudanças podem deixar dentro de nós.
ResponderEliminarBeijo terno, SD :)