domingo, 30 de outubro de 2016

Se morresse, perguntavas, porque não me telefonaste?


Não há motivo para te importunar a meio da noite, 
como não há leite no frigorífico, nem um limite
traçado para a solidão doméstica.

Tudo desaparece. Nada desaparece. Tudo desaparece
antes de ser dito e tu queres dormir descansada.
Tens direito a um subsídio de paz.

Se eu escrever um poema, esse não é motivo para te
importunar. Eu escrevo muitos poemas e tu trabalhas
de manhã cedo.

Toda a gente sabe que a noite é longa. Não tenho o
o direito de telefonar para te dizer isso, apesar dessa
evidência me matar agora.

E morro, mas não morro. Se morresse, perguntavas:
porque não me telefonaste? Se telefonasse, perguntavas:
sabes que horas são?

Ou não atendias. E eu ficava aqui. Com a noite ainda
mais comprida, com a insónia, com as palavras
a despegarem-se dos pesadelos.

José Luís Peixoto

3 comentários:

  1. Agora lembrei que se pode ser preso por ter cão, e por não o ter :=)

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  2. esse nã sabe o que diz... é claro que ligando no meio da noite, só há uma pergunta que se coloca: estás bem?

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  3. Há telefonemas e telefonemas
    Há horas e horas
    Mas o telefone na hora H
    ou o telefone na hora Y
    tem sempre o seu Q...

    Quest...

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