quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Pensar portugal

Nós somos um país de «elites», de indivíduos isolados que de repente se põem a ser gente. Nós somos um país de «heróis» à Carlyle, de excepções, de singularidades, que têm tomado às costas o fardo da nossa história. Nós não temos sequer núcleos de grandes homens. Temos só, de longe em longe, um original que se levanta sobre a canalhada e toma à sua conta os destinos do país. A canalhada cobre-os de insultos e de escárnio, como é da sua condição de canalha. Mas depois de mortos, põe-os ao peito por jactância ou simplesmente ignora que tenham existido. Nós não somos um país de vocações comuns, de consciência comum. A que fomos tendo foi-nos dada por empréstimo dos grandes homens para a ocasião.

Vergílio Ferreira  28 Jan 1916 / 1 Mar 1996 

Semblante errante de palavras



Não te enganes sobre as minhas lágrimas:
vale mais que os que amamos partam quando ainda 
conseguimos chorá-los.
Se ficasses,talvez a tua presença,ao sobrepor-se-lhe,
enfraquecesse a imagem que me importa conservar dela.
Tal como as tuas vestes não são mais que o invólucro do teu corpo,
assim tu também não és mais para mim
do que o invólucro de um outro que extraí de ti
e que te vai sobreviver.
MY

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Foste ao mar outra vez?

Foste ao mar outra vez?
E onde queres tu que vá? Ele é que me chama !

Por vezes é o espelho do que quero.
Água salgada não mata a sede...porém, pode açaimar o fogo 
de outras sedes... que angustiam.
Sim, outras sedes !

A pele julga...mas é transitório o seu julgamento.
Tanto quanto nós.
Excelente…
por mim fico-me pela pele de galinha,
ou pela imitação do céu!
Porque a nossa memória não se apaga quando tomamos banho.
Mesmo no mar


HHoje 

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

And we will try again



Agora não há razão que me acorrente à terra.
Bebo a manhã por um copo sujo,
acreditando talvez que ninguém envelhece em vão,
que todas as batalhas me hão-de servir no futuro.
Mas dentro de mim eu sei que quero desperdiçar-me,
gastar-me nos gumes, nos arcos que me fundam.
Não me pareço com nada,
não me reconheço em lugar nenhum da casa.

Rui Pires Cabral

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

El silencio es la mas elocuente forma de mentir.



A partir de hoy 

voy a amarte con silencios,
provocando ausencias
e inventando distancias;
desde hoy voy a amarte sin poemas,
con muy pocas acciones
y escasas palabras…
a partir de hoy voy a amarte así,
como tú me amas. 


Mario Benedetti.

sábado, 16 de janeiro de 2016

Semblante de mim



Vesti o meu melhor vestido e saí para a rua.
Vesti um assomo de luz e parti.

Não foi o que escolhi.
Mas sim o que me permiti.

Embalei-me na noite serena,
Tropecei algumas vezes
E pedi que não me chamem.

Voltei na rota da vida
E acrescentei ao que levei
Apenas mais de mim.

HHoje

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Luz


A magia das palavras da  Maria sou eu


"- Acendo a luz?" perguntou-lhe, ao entrar na porta à sua frente.

"- Não é preciso. Tu iluminas os lugares!" respondeu-lhe.

Maria Eu 2013


quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Essa "Coisa" repelente

É certo que a infelicidade não depende apenas da dor,
mas a alegria, essa, só devia depender da ausência de dor física.
Vinte séculos inteiros e completos não inventaram uma explicação do sofrimento;
sofre-se em comparação com o que é não sofrer,
e nenhum homem saudável quer ser educado previamente para aquilo que é mau.
Já não se treina a resistência à dor:
evita-se, sim, a mistura com essa 'coisa' repelente.

Gonçalo M.Tavares

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Hoje foi um dia de palmas vazias

Alguns homens são de tripas e escamas, depois de amanhados ficam um pouco que chega e mal se vê. 
Há outros em que tudo se aproveita, homens com segredos nas entranhas e na pele, que contam histórias sem fim.

Nuno Camarneiro
"Hoje foi um dia de palmas vazias, senti-lhes nos olhos" - Alex

domingo, 10 de janeiro de 2016

Ponham-me a "correr com o tempo"

E, já agora tirem-nos daqui estes trastes velhos e gastos que sufocam o tempo.
Este nosso tempo cada vez mais curto e sem rumo.

- Despachem-se, que não temos tempo a perder!
Dizem os homens que não têm braços partidos nem lhes pesa a idade deste tempo.

- Proibido a vagarosos, proibido viver sem pressa!
Não temos tempo para vos olhar, monte de massa disforme que nos dá o pão e o nada.
Dizem os homens deste tempo.

- Mexam-se, mexam-se!
Porque este tempo nos falha, e transformou-nos numa desvairada agonia sem rosto, obstinada e de consumo desenfreado.
- Depressa, Sim!
Nós queremos ser felizes, por isso corremos em círculos dentro dos próprios passos. 

O tempo, esse, vamos matar sem piedade.


HHoje 

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Quero amar-te em ataque continuado

O amor também é isto. Ainda não percebeste, propriamente, o que isto é. Vamos lá aos factos. Sabes, apenas, com toda a certeza convicta, assertiva e afirmativa, que nunca será a mulher que, na noite do primeiro encontro, tenta obrigar-te a despejar o cinzeiro do carro por lhe fazer impressão as beatas.
O amor estará mais próximo de uma caixa de supermercado, e da funcionária que te pergunta
“vai desejar-me?”.
E, então, esbugalhas os olhos, dás dois passos atrás e ainda deixas cair as compras. A fila vai longa, mas és só tu e ela naquele expediente. Enches o peito com três respirações e respondes que sim. Respondes que sim, no mais estridente sim que alguma vez gritaste na vida. O amor também é isto, dizeres que sim e receberes um saco em troca. No amor, às vezes, há traição, até na retórica de supermercado.
No amor precisas de credencial para entrar. Ou então compras bilhete e aplaudes da bancada.
O amor também é isto: escreveres coisas parvas como esta e, mesmo assim, fazer o outro sorrir. E chegares à conclusão de que o amor só sobrevive na parvoíce. Até mesmo quando, num estádio de futebol, enches o peito com três respirações e aproveitas o intervalo para avançares com um esquema táctico para a adepta do lado (que até tem corpo de ginásio, cabelos pretos compridos, olhos verdes, top cor-de-rosa, e calças pretas de cabedal, justinhas no rabiosque, como tu gostas), mesmo que a única conversa em comum tenha sido insultar o árbitro e criticar as opções do treinador.
“Quero amar-te em ataque continuado.
Podíamos fazer uma transição rápida e depois vermos a segunda parte juntos, o que te parece?”
O amor, às vezes, também é isto, levares um tabefe e veres a tua equipa a marcar um auto golo. Amar é, também, acreditar no poliamor. É acreditares que é possível amar toda gente sem amar ninguém.
E é estares à porta de casa, dentro de um carro de alguém, a sentir palpitações e acreditares que é por estares feliz; acreditares que, se o amor não existir, tem de ser reinventado.E então sais para a rua, e só tens vontade de repetir o que acabaste de inventar.Se o amor não existir, tem de ser reinventado.O amor reinventa-se quando adormecem os dois num sinal vermelho.O amor reinventa-se quando pões o mundo inteiro a buzinar para ti e para ela.É a altura em que voltas a entrar no carro, enches o peito com três respirações,e te declaras em total liberdade.
Com tanta liberdade, que até os gases parecem cheirar a Armani.
É quando ela te diz: o amor também é isto. Percebeste agora?

RMMendonça

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Three Wise Men

Uma pauta maravilhosa



Parabéns Amor

Encosta o teu ouvido ao meu peito e ouvirás o oceano.
Dentro dele, 

conchas falam das saudades que tenho de ti. 
De manhã, quando o orvalho ainda dorme na planície
eu tenho aquele olhar de criança 

que deixa escorrer a lágrima salgada e pura.
HHoje

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Inconstância da vontade




Segredar a vontade ao corpo,
ouvi-lo, 
 deixar que percorra a vontade.
A vontade de trair quando nunca o fez.
Tantas vezes se entregou sem retorno ou alento.
Depois de tantos anos e quando finalmente se descobriu outra,
entendeu quem era, o que lhe dava prazer.
Que dava prazer.
O corpo respondeu e plenamente se fez feliz.
Que compasso no tempo lhe deu essa resposta,
essa atroz resposta
a um corpo adormecido no medo.

Que quer trair, mas sabe com quem quer trair.


Hhoje 2016